“Ali desejava ele fartar-se das alfarrobas
que os porcos comiam, mas ninguém lh’as dava. Caindo, porém, em si, disse:
Quantos empregados de meu pai têm pão com fartura, e eu aqui estou morrendo de
fome! Levantar-me-ei, irei a meu pai e dir-lhe-ei: Pai, pequei contra o céu e
diante de ti. Já não sou digno de ser chamado teu filho; trata-me como um dos
teus empregados.” (Parábola do Filho
Pródigo) Lucas 15:16-19.
- Cheguei à conclusão – disse,
pausada e amarguradamente – de que o melhor que todos temos a fazer é nos
recomendarmos a Deus, resignando-nos de boamente às peripécias que ainda
sobrevenham... Para nada há valido o desespero, senão para nos tornar ainda
mais desgraçados! Tanta revolta e insensatez... e nada mais obtivemos a não ser
o agravo das nossas já tão atrozes desgraças!... Por aí se poderá ver que vimos
escolhendo caminhos errados para nossos destinos... É inegável, porém, que somos
todos subordinados a uma Direção Maior, que independe de nossa vontade!... Isso
é assaz significativo... Não sei bem se morri... Mas, sinceramente, creio que
não!...
A senhora minha mãe era pessoa
simples, humilde, de poucas letras, mas boa devota à crença e ao respeito a
Deus. Afirmava aos filhos, com estranha convicção, quando os reunia ao pé da
lareira a fim de ensinar-lhes as orações da noite, de mistura com os princípios
da tal, criada pelo Ser Supremo e destinada à gloriosa redenção pelo amor de Jesus-Cristo,
e que dessa alma daríamos contas, um dia, ao Criador e Pai! Nunca mais, desde
então, obtive ciência de mais alto valor! Considero as aulas ministradas por
minha mãe, durante o serão da família, superiores às que, mais tarde, aprendi
na Universidade. Infelizmente para mim, sorri à sabedoria materna,
embrenhando-me pelos desvios das paixões mundanas... Contudo, ó minha mãe! Eu aceitava
a possibilidade da crença formosa que tentaste infundir em minha alma revel!
Não fui propriamente ateu!...
Hoje, passados tantos anos, e
depois de tantos sofrimentos, colocado em situações que escapam à minha
análise, eu me convenço de que a senhora minha mãe estava com a razão: - devo
possuir uma alma, realmente imortal! Escapa-se de um tiro de revólver, e pode-se
até restabelecer-se! Curamo-nos da ingestão de um corrosivo, tais sejam as
circunstâncias em que o tenhamos usado. Mas não se escapa de uma forca, como a
que me destinei! E, se estou aqui e se sofri tudo quanto sofri sem conseguir
aniquilar dentro de mim as potências da vida, é porque sou imortal! E se sou
imortal é que possuo uma alma, com efeito, porque, quanto ao corpo humano, esse
não é imortal, pois se consome no túmulo! E se possuo uma alma dotada da
virtude da imortalidade é que ela
proveio de Deus, que é Sempiterno! Oh, minha
mãe, tu dizias a verdade! Oh, meu Deus! Meu Deus! Tu existes! E eu a renegar-te sempre, com meus atos,
minhas paixões, meu descaso às tuas normas, minha indiferença criminosa aos
teus princípios!... Agora... eis que é soada a hora de prestar-te contas da
alma que tu criastes – da minha alma! Eis que nada tenho a dizer-te, Senhor,
senão que minhas paixões infelicitaram-na, quando o que determinaste ao criá-la
era que eu a conduzisse obedientemente ao teu regaço de Luz! Perdoa-me!
Perdoa-me, Senhor Deus!...
Confissão de culpa, pelas luzes renovadoras do
arrependimento, do espírito suicida Mário Sobral, feita logo após ser resgatado
pela misericórdia divina das tenebrosas consequências por si próprio buscadas no autocídio. Livro: Memórias de um Suicida, cap. III, médium Yvone A.
Pereira.
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