“A Terra, conseguintemente,
oferece um dos tipos de mundos expiatórios, cuja variedade é infinita, mas
revelando todos, como caráter comum, o servirem de lugar de exílio para
Espíritos rebeldes à lei de Deus.” O Evangelho Segundo o Espiritismo – capítulo
III – item 15.
Exílio para Espíritos rebeldes à
Lei de Deus. Que traço poderia definir mais claramente a nossa condição moral
na Terra?
Por vezes sucessivas, após o
desenlace carnal, deparamos com o remorso e, mais recentemente, alguns de nós,
com o arrependimento sincero. Renascemos trazendo impresso na alma um ansioso
desejo de recomeço. Chegando à vida física, encontramos com as frustrações
necessárias. Caímos no desapontamento e, por fim, na rebeldia, negando-nos a aceitar
nossas necessidades espirituais. Surgem os conflitos com o corpo, a sociedade,
a profissão e a família. Em verdade, o maior adversário somos nós mesmos. A
resistência declarada em aceitar quem somos. A rebeldia de ser, existir e
viver. Instala-se nesse passo um terrível estado de insatisfação crônica com a
vida. Sentimentos de culpa, tristeza e medo delineiam estados mentais doentios
de punição, perfeccionismo e baixa autoestima, conduzindo-nos aos dramas
dolorosos da angústia e da depressão – um verdadeiro leque de mutações
emocionais. Posteriormente, esgotados pelos conflitos interiores ao longo do
tempo, as criaturas ainda se aninham nas perturbadoras crises de descrença e
vazio existencial, e vamos em direção a novos ciclos de dor, que desabrocham a partir
das atitudes e escolhas enfermiças.
Raríssimos escapam de semelhante
“roda da vida”. Isso é o carma, a teia da existência tecida por nós mesmos nos
roteiros da reencarnação.
Carma não é por fora, é por
dentro de nós. As insatisfações de fora espelham a rebeldia interior. A vida
por fora reflete programações da vida mental. Surge de dentro o que temos no
exterior. Velhos modelos mentais alicerçados em crenças e valores.
Pela forma como reagimos aos
episódios da existência, determinamos o curso dos prazeres e desgostos de
nossas vidas.
O rebelde, por exemplo, agrava
seus passos em autênticos torvelinhos de emoções perturbadoras. A rebeldia é
apressada, inquieta, arrogante e revoltada. É a feição comportamental de almas
que não aceitam a realidade. Daí tanta amargura, pois a vida é e será sempre o
que tem de ser, considerando que tudo o que nos cerca reflete o que somos ou
seremos.
Rebeldia significa relutância,
teimosia, inconformação. Há quem nela veja uma virtude, conceituando-a como um
ato de resistência, bravura e coragem em não se abater diante dos reveses.
Estreito limite existe entre o caráter patológico da rebeldia e esse aspecto
que alguns tomam como qualidade. Analisemos o tema.
O rebelde paralisa. O corajoso
avança.
O rebelde sofre. O corajoso liberta-se.
A rebeldia torna a criatura
apressada, agitada interiormente e com avançados níveis de ansiedade ou
depressão. Uma personalidade rebelde debate-se intimamente, tem baixíssimo
nível de tolerância às frustrações e uma conduta irritável. Uma personalidade
corajosa avança com serenidade, ultrapassando sua zona mental de conforto com
moderação e lucidez.
A rebeldia tira a condição de
pessoa centrada em valores e metas para situá-la nos dois extremos do psiquismo
revoltado: ora na arrogância, ora na descrença. A arrogância é a atitude
daqueles que ainda encontram energia para expressar sua inconformação. A
descrença é o estado de quantos já se encontram exauridos de tanto reagir aos
alvitres da existência.
Quando na arrogância, a alma se
afoga nas vertigens da insensatez.
Quando na descrença, tomba nas
armadilhas do medo.
Na arrogância, nossa maior
ilusão é não aceitar o eu real em detrimento do eu ideal. Romper com a imagem que
o ego construiu sobre nós, para nos defender da angustiante realidade do que
somos.
Na descrença, nossa maior
dificuldade é aceitar que a vida jamais será como queremos. Nisso reside nossa
incapacidade em lidar com perdas e sonhos desfeitos ou não alcançados.
A arrogância traz a sofreguidão
das metas que se desfazem como bolhas de sabão aos nossos olhos, levando-nos ao
vício de sermos exímios fabricantes de sentidos para a vida pessoal e daqueles
que nos cercam.
A descrença traz a paralisia da
depressão que nos aprisiona no catre da ausência de sentido, subtraindo-nos a
alegria do ato de viver.
O arrogante é um inveterado
“criador de destinos”, com os quais procura atender a sua inesgotável tendência
de gerir a vida alheia, na condição de um semideus.
O descrente é um cultor da
revolta que está atemorizado com a morte de sua vida idealizada e impossível.
Arrogância e descrença são
extremos psicológicos e emocionais de um mesmo motivo: a ação de não aceitar os
processos necessários da vida e suas leis de progresso.
Ambos, arrogantes e descrentes,
são pessoas que temem ardentemente a queda, o fracasso, o desacerto. O
arrogante, com medo de errar, tenta demais e tomba na prepotência. O descrente,
com medo do erro, evita arriscar e escolher.
O arrogante se vê além do que é.
O descrente foge de quem é.
Estar em quaisquer destas
extremidades significa limite e nível patológico da vida mental. Nesse clima da
vida interior, a maior enfermidade dos dias atuais instala-se sorrateira e
decisiva: a ausência de sentido para os dias da nossa existência. Arrogantes e
descrentes caminham ao sabor de intermináveis combates íntimos que sugam as
forças morais e minam os ideais possíveis. Estabelece-se uma lastimável pressão
sobre os pensamentos, causando um estado de confusão mental. Um desgosto,
abrupto e dominador, subtrai significativa parcela do afeto e da sensibilidade.
Cansadas, tais criaturas correm atrás do dever ao peso de dor e desânimo,
cobrança e rigidez.
Rebeldia é resultante da
ausência de habilidade em movimentar o mais sublime patrimônio conferido pelo
Criador à criatura: a fé.
A fé é o combustível do ato de
viver. A energia interior que vem das profundezas inabordáveis da alma para
equilibrar nossa mente e nos nutrir com a energia da vida, a energia de Deus,
que sustenta o universo em profusão.
Fé é essa força que está no
íntimo de nós mesmos qual uma pepita reluzente acomodada no lago pantanoso de
nossa sombra. A luz escondida que
necessita ser colocada no velador, onde possa iluminar nossa vida consciente. A
sombra é também um centro de talentos
e qualidades ocultas que solicitam manifestação.
O contato com a energia da fé
desperta o estado de otimismo, irradia a paciência, espalha a confiança e
fortalece a resignação nas atitudes, levando-nos a aceitar a vida como ela é.
A fé mantém a mente em harmonia
e domínio interior, por consequência, habituando-nos a agir com foco no
presente, sem as agonias com o futuro ou os descontentamentos do passado. Estar
no presente significa viver, ter sentido para continuar um dia após o outro na
busca consciente por metas e motivações.
Uma de suas propriedades
energéticas mais importantes é a função seletiva. Como fosse uma bateia –
recipiente para garimpar metais preciosos nos rios –, ela seleciona o que há de
melhor em nosso campo psíquico. É uma chave para abrir o Self divino que está adormecido em nosso íntimo.
Ela é a base da vida em toda
parte. É a alma da esperança, sem a qual não conseguimos enxergar a trilha
excelsa traçada por Deus para nossa felicidade. É a fonte do prazer de viver.
Sem a esperança como viver? Ela
é o efeito no campo dos sentimentos quando encontramos o ritmo vibratório de
Deus na vida. Surge quando identificamos o fluxo de energias divinas que
conspiram para a nossa ascensão.
Dizem os Sábios Instrutores: “Inspiração divina, a fé desperta todos os
instintos nobres que encaminham o homem para o bem. É a base da regeneração.
Preciso é, pois, que essa base seja forte e durável, porquanto, se a mais
ligeira dúvida a abalar, que será do edifício que sobre ela construirdes?”
Toda a nobreza espiritual da qual somos herdeiros de Deus somente poderá se expressar sob o influxo da fé. Todos os instintos em nós colocados para o progresso, sob a sua tutela são dirigidos para tornar a nossa vida um ato de dignidade repleto de alegria e prazer de viver.
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